sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
Minha filha, é isto que queres ser?
Minha mãe e eu sabíamos
que minha identificação com as pessoas pobres e sofridas se daria nos caminhos
da IECLB. Mas como eu não me imaginava nem como professora catequista, nem como
diaconisa, que eram as possibilidades que víamos, e como eu era uma menina, estávamos numa encruzilhada.
Um dia minha mãe e meu pai
voltaram da cidade e minha mãe veio gritando de longe, erguendo o Jornal
Evangélico, dizendo:
- Minha filha, é isto que queres
ser?
- É!
Era a foto da Pastora Rita
Panke estampada na capa do Jornal Evangélico. Não tivemos mais dúvidas. O
coração da minha mãe e o meu dispararam
de alegria, porque a nossa IECLB estava começando a se abrir para o ministério
pastoral de mulheres. Meu pai, minha irmã e meu irmão igualmente vibraram com a
gente, passando a fazer tudo para que tudo desse certo.
Após o próximo culto na
comunidade, numa conversa linda que sempre tivemos com parentes em frente da igreja,
o assunto foi este. O Pastor Bruno estava com a gente e me garantiu que faria
tudo para me apoiar. Ele disse ainda que tinha certeza que “esta menina tem
vocação para ser pastora”, o que encheu os olhos do meu pai de lágrimas. E
minha mãe disse apenas:
- Eu sei, Pastor. Eu
também tenho certeza disso.
Louraini Christmann, Lola, Horizontina.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
Estudo? Diferença?
Sempre fui muito devagar diante de críticas e depreciações. De certa forma, é uma ferramenta boa para que eu não perceba o escárnio, e a má recepção que existem nas relações.
Na primeira "Conferência Pastoral" (termo que eu havia aprendido no Distrito Uruguai, lugar de meu estágio, cheio de pastoras que mexiam na linguagem) fui alertada que ali era "conferência de pastores". Era uma "PfarrConferenz" - PC - o que brincava com o termo "Partido Comunista" e trazia lembranças de gente que havia brigado contra a ditadura.
Ok, isso parecia ser importante e achei legal a definição política da colegada.
Só que, quando iam falar nas comunidades, a brincadeira era desfeita, e era dito com todas as letras que as reuniões eram "Conferências de Pastores".
Riso engolido, minha fala também, já que nem de longe me incluíam na definição das reuniões.
Ao mesmo tempo que me queria reconhecida, me sentia traidora explícita das esposas de pastores, que haviam assumido a missão de "Fraupfarrer" nas comunidades, eram chamadas de pastoras algumas vezes, e eu ali... querendo ser diferente delas... de mulheres que acreditavam na mesma missão que eu... de mulheres que tinham uma perspectiva de trabalho semelhante ao que eu havia construído: convivência, testemunho, confissão de fé no cotidiano.
De certa forma, conhecer essas "Fraupfarrer's" me ajudou a construir um pastorado muito mais dialogal, muito menos detentor de poder - coisa que eu também tinha conhecido em outras "esposas de pastores" que gostavam de ostentar um status quo que eu nunca entendi de onde viera.
Na primeira "Conferência Pastoral" (termo que eu havia aprendido no Distrito Uruguai, lugar de meu estágio, cheio de pastoras que mexiam na linguagem) fui alertada que ali era "conferência de pastores". Era uma "PfarrConferenz" - PC - o que brincava com o termo "Partido Comunista" e trazia lembranças de gente que havia brigado contra a ditadura.
Ok, isso parecia ser importante e achei legal a definição política da colegada.
Só que, quando iam falar nas comunidades, a brincadeira era desfeita, e era dito com todas as letras que as reuniões eram "Conferências de Pastores".
Riso engolido, minha fala também, já que nem de longe me incluíam na definição das reuniões.
Ao mesmo tempo que me queria reconhecida, me sentia traidora explícita das esposas de pastores, que haviam assumido a missão de "Fraupfarrer" nas comunidades, eram chamadas de pastoras algumas vezes, e eu ali... querendo ser diferente delas... de mulheres que acreditavam na mesma missão que eu... de mulheres que tinham uma perspectiva de trabalho semelhante ao que eu havia construído: convivência, testemunho, confissão de fé no cotidiano.
De certa forma, conhecer essas "Fraupfarrer's" me ajudou a construir um pastorado muito mais dialogal, muito menos detentor de poder - coisa que eu também tinha conhecido em outras "esposas de pastores" que gostavam de ostentar um status quo que eu nunca entendi de onde viera.
Margarete Emma Engelbrecht , hoje em Niterói, RJ - pastora
quarta-feira, 12 de dezembro de 2012
Pedacinhos da Teologia de Libertação desafiando a menina Louraini nos anos 70
Nossa família participava
regularmente das celebrações da comunidade. Era no período em que meu irmão
Lauri e eu (somos gêmeos) participávamos no Ensino Confirmatório.
As palavras do Pastor
Bruno Gottwald me desafiavam demais. Ele era simples e direto. Usava
simbologia, desenhos, histórias e canções novas que eu amava.
Na sua pregação,
referia-se muito ao povo sofrido de Deus lá nos tempos bíblicos e aqui no nosso
tempo. Lembro que ele citava exemplos vindos da Comunidade de Mambuca, uma
comunidade sofrida do interior e de um lugar que era popularmente chamado de
Campina, lugar que na época sobrava para quem não tinha outro lugar. Havia
muito preconceito.
Eu queria poder fazer
algo. O desafio do Pastor Bruno mexia demais comigo. E minha mãe e eu sabíamos
que este fazer algo seria por dentro da igreja. Ela me perguntava:
- Tu quer ser catequista?
- Acho que não, mãe!
- Tu quer ser diaconisa?
- Acho que não, mãe!
- O Lauri é pra ser
pastor.
- Ah, pois é, mãe, que
pena que também não sou guri!
- É, que pena!
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
Cantarolando!
Quando eu era menina, eu
vivia cantando. Aquelas canções da Jovem Guarda que as rádios tocavam o tempo
todo, eu cantarolava o tempo todo. Depois eu fui descobrindo a MPB (Música
Popular Brasileira). Aí que não parei mais de vez.
Minha mãe dizia, quando me
chamavam e eu não respondia: “A Mosi deve estar cantarolando por aí”. E eu “Estava a toa na vida...”, às vezes
ainda tirando leite, ou dando uma baciada de leite pras ninhadas de filhotes
das minhas gatas, que não eram poucas.
Nos primeiros dias de IPT,
não deu outra: passei cantarolando por um grupo de colegas meninos.
- Guria, tu passou por
eles cantando!!
- Tá, e daí? Não pode?
- Não, não pode!
- Mas por que não pode?
- Por que eles vão pensar
que tu estás “te fresqueando”.
Marli e Sílvia passaram a
cantar comigo e juntas convidamos nossos colegas a cantarolar com a gente.
Cantamos tanto!
E nestes anos tantos, tanto
cantamos em conjunto!
Cantarolamos nossos hinos
de liberdade e igualdade
Nas lutas por liberdade e
igualdade
Abafados por muitas vezes
Liberados por tantas
outras vezes
E continuamos cantarolando
pra vida
Nos “fresqueando”
livremente
E a vida cantarolando
Fica “se fresqueando” pra
gente!
Maravilhosamente!
Louraini Chrismann, Lola, Horizontina
Pode!
Quando eu cheguei no IPT
(Instituto Pré Teológico) no Morro do Espelho de São Leopoldo, cheguei com
minha mala cheia de sonhos e de saias.
Cheguei menina virando
mulher, nos meus quase 18 anos, no início do ano de 1976.
Ao desfazer a mala, tentei
logo colocar cada sonho no seu devido lugar, para que continuassem sonhando, e
cada saia... Uma das saias nem guardei.
Usei quando fomos juntas tomar a primeira refeição no refeitório.
- Tu vais usar saia?
- Vou! Não pode?
- Não. Não pode! Nós não
usamos saias aqui!
Apavorado, o meu olhar se
refugiou nos olhares de Sílvia e Marli,
minhas colegas “novatas”. As duas me olharam com aqueles olhares de “Pode!”,
que eu nunca mais esqueci.
E assim eu pude.
E assim nós pudemos.
As nossas saias e os
nossos sonhos puderam tanto
Com nossos olhares de
“pode!”
Com nossos ouvidos de
“pode!”
Com nossos sentidos de
“pode!”
E estamos “podendo” tanto
Já há tantos anos,
Com a graça de Deus!
Pode?
Pode!!!
Louraini Christmann, Lola, Horizontina
sábado, 8 de dezembro de 2012
o que é tão diferente?
Chegamos com a mudança na quinta, e nos disseram que o açougue da localidade só trabalhava quinta à tarde e sexta pela manhã. Ok, na sexta seria dia de ir buscar carne para a semana.
Fiquei sozinha na casa pastoral.
Chega um carro. Fico feliz que vou fazer o "primeiro atendimento"...
O senhor, dono de si e de uma comunidade inteira, pelo jeito, nem quis entrar. Com a mão estendida foi logo dizendo: "vim aqui lhes dar as boas-vindas e dizer que aqui só tem lugar para um pastor trabalhar. Me disseram que tu és pastora também. Nunca vi disso. Melhor então ir os dois embora".
Depois desse dia, resolvi ter a esperança bem recolhidinha. Melhor não se esbaldar.
Claro que fico pensando que, se tivéssemos mesmo ido embora dali, eu não aprenderia tanto, nem teria tanta saudade daquele povo tão diferente.
Claro que tenho a mais absoluta certeza de que fomos usados por toda estrutura eclesiástica para "abrir campo de trabalho".
Mas é bom ter sempre a certeza de que toda rosa tem espinho. E que esses espinhos machucam sobremaneira, se você não souber se proteger.
Até hoje acho graça do meu primeiro espinho. Ele foi tão claro e evidente!
O homem nunca tinha visto disso, de existir pastora. No que mesmo era diferente? Era diferente?
Os 7 anos que passei ali, com aquelas pessoas, me tornaram mais esperta. Cara de boba, é verdade... mas muito mais esperta. Algumas vezes, até vingativa: quando este homem teve dores de alma, eu o acompanhei (Seelsorge - poimênica - graça do pastorado).
Talvez isso me fez diferente. Meus colegas homens talvez se vingariam de forma explícita, assim já os vi em ação.
O que nos faz diferente?
Fiquei sozinha na casa pastoral.
Chega um carro. Fico feliz que vou fazer o "primeiro atendimento"...
O senhor, dono de si e de uma comunidade inteira, pelo jeito, nem quis entrar. Com a mão estendida foi logo dizendo: "vim aqui lhes dar as boas-vindas e dizer que aqui só tem lugar para um pastor trabalhar. Me disseram que tu és pastora também. Nunca vi disso. Melhor então ir os dois embora".
Depois desse dia, resolvi ter a esperança bem recolhidinha. Melhor não se esbaldar.
Claro que fico pensando que, se tivéssemos mesmo ido embora dali, eu não aprenderia tanto, nem teria tanta saudade daquele povo tão diferente.
Claro que tenho a mais absoluta certeza de que fomos usados por toda estrutura eclesiástica para "abrir campo de trabalho".
Mas é bom ter sempre a certeza de que toda rosa tem espinho. E que esses espinhos machucam sobremaneira, se você não souber se proteger.
Até hoje acho graça do meu primeiro espinho. Ele foi tão claro e evidente!
O homem nunca tinha visto disso, de existir pastora. No que mesmo era diferente? Era diferente?
Os 7 anos que passei ali, com aquelas pessoas, me tornaram mais esperta. Cara de boba, é verdade... mas muito mais esperta. Algumas vezes, até vingativa: quando este homem teve dores de alma, eu o acompanhei (Seelsorge - poimênica - graça do pastorado).
Talvez isso me fez diferente. Meus colegas homens talvez se vingariam de forma explícita, assim já os vi em ação.
O que nos faz diferente?
(Margarete Emma Engelbrecht - pastora em Niterói, RJ - Ministra desde 1988, em Barranco, São Lourenço do Sul, RS; em Nova Petrópolis,RS, e em Niterói, RJ.
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